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Associações e a Prática de Atividades Econômicas: Entendendo a Distinção entre Fins Lucrativos e Fins Econômicos

Por 31 de julho de 2023agosto 1st, 2023Artigos

Por Dra. Fernanda Soares Ortolan

Especialista em Direito do Terceiro Setor, Pós-graduada em Direito Tributário e Cofundadora do Instituto Brasileiro de Negócios Sociais – Bureau Social

Ao abordarmos o terceiro setor e sua inserção na esfera econômica, é imprescindível compreendermos as nuances que o Código Civil Brasileiro nos apresenta sobre as distintas naturezas jurídicas existentes em nosso ordenamento, em especial, a das associações.

As associações, como determina o artigo 53 do Código Civil, são constituídas pela união de pessoas com propósitos não econômicos. Por outro lado, as sociedades são agrupamentos voltados ao exercício de atividade econômica para compartilhamento de resultados entre os sócios (art. 981 do Código Civil).

No entanto, uma interpretação mais cuidadosa do artigo 53 nos leva a compreender que a menção a “fins não econômicos” não proíbe, a prática de atividades econômicas pelas associações. A questão central está no entendimento do que se quer dizer por “fins econômicos” e se isso equivale, ou não, a “fins lucrativos”.

É aqui que a diferenciação entre atividade e finalidade se faz crucial. O Código Civil em momento algum sinaliza que associações não possam ter “atividade” econômica, e sim “fins” econômicos. Assim, a atividade econômica de uma associação não muda sua natureza jurídica, desde que os frutos obtidos não sejam distribuídos entre os membros, mas sim reinvestidos na própria associação.

Essa interpretação se alinha ao conceito de associações como agrupamentos de pessoas (físicas ou jurídicas) em busca de objetivos comuns, conforme garantido pela Constituição Federal (art. 5, incisos XVII e XVIII). Segundo Savigny, essas entidades possuem uma identidade independente de seus membros, mantendo sua essência e unidade mesmo diante de mudanças em sua composição.

“A característica essencial de uma corporação é que seus direitos sustentam-se não sobre seus membros individualmente considerados, nem mesmo sobre todos seus membros reunidos, mas sobre um conjunto ideal. Uma consequência particular, mas importante, é que a mudança parcial ou mesmo integral dos seus membros não atinge nem a essência nem a unidade da corporação.” SAVIGNY. Traité de droit romain. Paris: Librarie de Firmin Didot Frères, 1855, v.2, p.237.

Neste sentido, o que define uma associação não é seu objeto social, mas sim seu propósito. Isso significa que as atividades que a entidade pode desenvolver são amplas e diversas, desde que

alinhadas a seus propósitos. A ausência de finalidade lucrativa não significa ausência de finalidade econômica. Aliás, as associações devem, inclusive, exercer atividades econômicas organizadas para a produção ou a circulação de bens ou serviços, em prol de sua saúde financeira e econômica.

É preciso entender, portanto, que as associações podem se tornar importantes atores econômicos. A prática de atividades econômicas não descaracteriza sua natureza jurídica, desde que os lucros gerados sejam reinvestidos na própria associação. Tal perspectiva amplia as possibilidades de atuação das associações, permitindo-lhes desenvolver atividades de mercado cujos resultados serão alocados para a consecução e ampliação de seus objetivos sociais.

Neste panorama, é imperativo fomentar a capacidade das associações de desenvolverem atividades econômicas, diversificando suas fontes de sustentação além das contribuições dos associados. Esse movimento implica um avanço conceitual com relevantes implicações sociais e fortalece o papel das associações na sociedade brasileira, principalmente na condição constitucional de ‘complementar as ações do Estado’.

Assim, concluímos que a atividade econômica exercida por uma associação, desde que não vise à distribuição de lucros entre seus membros, mas sim ao reinvestimento na própria entidade, está em consonância com a legislação aplicável e não descaracteriza sua natureza jurídica de associação sem fins lucrativos.

Ainda assim, é sempre relevante buscar o auxílio de profissionais especializados em Direito do Terceiro Setor para garantir que todas as atividades estejam de acordo com as normativas legais e evitar eventuais problemas jurídicos e exigências cartorárias.

Campinas/SP, 31 de julho de 2023.

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